Ao sabor do vento
As versões conversíveis do Escort 2.0i XR3 e do Kadett GSi 2.0 aliam conforto e prazer em dirigir ao gostoso sabor de aventura e liberdade.

Matéria publicada originalmente na Revista Quatro Rodas.

Teste: Heymar Lopes Nunes
Fotos: Cláudio Larangeira

Você deve estar se perguntando por que testamos dois conversíveis justamente no mês em que termina o verão. OK, o calor dá acenos de adeus em boa parte do território nacional, mas a chegada do novo XR3 para enfrentar o GSi já é razão mais que suficiente para o teste – acima da dança das estações. Afinal, trata-se de dois carros pensados para rodar o ano inteiro: com a capota aberta, em pique de emoção, ou fechada, enfrentando chuva e frio.

O XR3 foi o primeiro dos conversíveis nacionais, em 1985, reinando solitário até 1991, quando chegou ao mercado o GSi. A briga foi dura para o Escort, com motor 1.8 carburado, já que o Kadett trazia inúmeras inovações de estilo e tecnologia, como o design mais aerodinâmico e a injeção eletrônica multipoint. A reação da Ford demorou dois anos para acontecer, mas mudou o panorama favorável ao Chevrolet: o novo carro tem tudo que o Kadett possui – e um pouco mais.

No último confronto entre os dois, o GSi foi 7 km/h mais rápido (175,4 km/h e 168,4 km/h respectivamente), indo de 0 a 100 km/h em 10s70 contra 12s18 do XR3. O Kadett mantém seu motor 2.0i com 121cv de potência, enquanto o Escort traz novo propulsor 2.0i, passou dos antigos 97cv para 116cv, ganou injeção eletrônica de combustível e virou o jogo: saiu-se vitorioso em quase todas as provas de desempenho, chegando a 186,4 km/h de velocidade máxima (183,2 km/h sem capota) e acelerando de 0 a 100 km/h em 11s18. O GSi cravou 183,3 km/h (181,6 km/h sem capota) e 11s35 respectivamente. Além do motor AP-2000i, da Volkswagen, o XR3 recebeu ainda nova caixa de cambio, da Transax, subsidiária argentina da Autolatina, e teve sua suspensão recalibrada. No GSi, nada mudou.

Internamente, as fábricas não pouparam equipamentos e materiais de primeira no acabamento, estabelecendo uma verdadeira batalha de luxo e conforto. Ar-condicionado e comando elétrico dos vidros (apenas dos dianteiros no Kadett e tambémn para os traseiros do Escort) são comuns a ambos. O XR3 ganha pontos com sua capota de acionamento eletro-hidráulico e pela direção com regulagem de distância. Já o GSi conquista corações com seu painel digital e o volante com regulagem de altura. O desempate, a favor do Ford, fica por conta do alarme antifurto, que impede curto-circuitos e ligações diretas, e ainda possui acionamento pela chave das portas. Aqui, o sistema de som do XR3, com rádio/toca-fitas e equalizador gráfico digital com quatro memórias programáveis e sete canais é só outro rico detalhe.

Os dois conversíveis têm alto poder de sedução quando se sente a ótima empunhadura do volante. E, ao pisar fundo no acelerador, se escuta o envolvente ronco dos motores – a trilha sonora dessa convidativa aventura. Os bancos Recaro, presentes nos dois modelos, abraçam o piloto, que deve estar preparado para experimentar uma suspensão "diferente". Em ruas e estreadas de asfalto irregular, a sensação é de que o carro vai "rachar ao meio". Mas não há com que se preocupar: isso é o resultado da grande torção sofrida pelo chassi, que supre a ausência da capota rígida.

A estabilidade direcional dos dois conversíveis acaba sendo um pouco prejudicada, principalmente em altas velocidades, mesmo sobre pavimento regular. O pequeno sacrifício na dirigibilidade foi a compensação pelo maior conforto aos passageiros. A suspensão traseira do XR3 é do tipo independente, enquanto no GSi o sistema trabalha com braços longitudinais ligados a um eixo rígido que funciona sob esforço de torção. Apesar das diferenças de construção, os resultados ao rodar são muito parecidos.


Os dois conversíveis são equipados com bancos Recaro e oferecem ótima posição de dirigir. Nesse ítem as diferenças ficam por conta da regulagem do volante: de altura no Kadett (acima à direita), e de distância no Escort (acima. à esquerda).

O maior prazer que um conversível pode oferecer sobre os esportivos cupês começa, logicamente quando se abre a capota. Mas o sol e o vento batendo no rosto – desmanchando os cabelos e obrigando os passageiros a elevar o volume da voz – tem o preço do barulho. Fechado, o XR3 cravou 70,4 decibéis de nível de ruído, ficando em 72,8 decibéis rodando aberto. Já o GSi, de 68,5 decibéis, saltou para 73,1 decibéis "a descoberto".

Se ao pisar fundo no acelerador as respostas rápidas empolgam, o mesmo não acontece na hora de parar, já que os dois conversíveis ficaram acima dos 30m nas provas de frenagem de 80 km/h à imobilidade. Sem travamento das rodas, o XR3 precisou de 30,6m e o GSi, de 30,9m, enquanto nas frenagens com travamento houve empate de 35,4m.

As médias de consumo de combustível, mesmo altas, não decepcionam e quase se igualam, apesar da pequena vantagem do Escort. Na média, o XR3 rodou 10,52 km/l. Na cidade, a diferença a favor do Ford se mantém: 8,37 km/l contra 8,22 km/l. Mas não é exatamente a "bebedeira" que decidirá, no bolso do consumidor, o pega entre as versões mais completas dos dois conversíveis.

No momento de assinar o cheque na concessionária, contudo, o Escort tem outro argumento muito forte: mais moderno e com capota automática, sai por Cr$606 125 000, enquanto o Kadett custa Cr$665 070 000 (preços do final de fevereiro). Como quem compra um esportivo é geralmente um apaixonado por carros, a devoção à marca também é decisiva. Mesmo que esse mercado não seja dos maiores no Brasil (em 1992, por exemplo, foram produzidas apenas 2.337 unidades), vale a pena arriscar olhares mais atentos a esse prazer de tiragem quase limitada.

O abre-fecha das capotas

Quanto tempo leva para abrir e fechar essas capotas? A do GSi, que tem projeto assinado pelo estúdio Bertone, da Itália, não fica em menos de 2 minutos – e muitos malabarismos. Todo o processo é manual: o motorista deve soltar duas travas, sair do carro e começar a dobrar a capota. Depois, ele precisa pular para o banco de trás para soltar as travas traseiras, terminar de recolher tudo, para então colocar a tampa de acabamento. Para fechar é a mesma novela vista de trás para frente. Já no Escort, cujo projeto de transformação foi feito inteiramente no Brasil, o acionamento é eletro-hidráulico e o processo todo não passa de 45 segundos. O motorista só precisa sair do carro no final da operação, para colocar o acabamento. Para evitar que a capota seja aberta ou fechada acidentalmente ou com o carro em movimento, o sistema só funciona com o motor desligado e com a chave de ignição na posição "acessórios". Fora dessas condições, o motorista deverá soltar manualmente as duas travas. Tudo em nome da segurança.

 

Reprodução autorizada pela Editora Abril.